O melhor seria não dar bola para o presidente que infernizou a vida do país durante quatro anos. Afinal, o que esperar dele até 31 de dezembro?
Um gesto nobre para se contrapor à sordidez de todos os gestos anteriores?
Bolsonaro não seria quem é se tivesse essa preocupação. Ele se dará por satisfeito se for lembrado por seus fanáticos seguidores, uma parcela modesta dos que votaram nele. A grande maioria que digitou seu número nas urnas o fez por se recusar a votar em Lula.
A recíproca é verdadeira. Uma fatia expressiva dos que votaram em Lula desejava em primeiro lugar livrar-se de Bolsonaro. Lula ganhou pela estreita diferença de 2 milhões de votos. O maior desafio que tem agora é consolidar sua vitória. Ele sabe disso.
É para impedir que isso aconteça, ou retardar o processo, que Bolsonaro e Valdemar Costa Neto, presidente do PL, se uniram na iniciativa afoita, descabida e inócua de pedir ao Tribunal Superior Eleitoral que anule os votos no segundo turno de 250 mil urnas.
Sem apresentar provas de que houve irregularidades, alegam que pode ter havido. Por que só votos de 250 mil urnas? Porque seria o suficiente para reverter a vitória de Lula e garantir a reeleição de Bolsonaro. E por que só votos dados no segundo turno?
Porque se pedissem a anulação dos votos dados nessas mesmas urnas no primeiro turno estariam minando os resultados das eleições de 90 deputados federais do PL, de governadores e senadores por ele apoiados. Simples, não? Pura molecagem.
Que não dará em nada, apressou-se a dizer o xerife das eleições, ministro Alexandre de Moraes. Mas que funcionará como incentivo para que baderneiros acampados em portas de quartéis continuem acreditando em uma possível intervenção militar.
Na impossibilidade de um golpe, quem sabe um maluco, do tipo Adélio Bispo que esfaqueou Bolsonaro em Juiz de Fora, não poupa o Brasil do convívio com Lula? Em último caso, quem sabe Deus não atende às preces dos seus filhos em modo desespero?
“A expectativa de que o tribunal dê qualquer decisão a favor de Bolsonaro é zero”, admite Ricardo Barros (PP-PR), líder do governo na Câmara. “Mas é importante que o partido apresente os seus argumentos para que não fique apenas no lamento”.
Para escapar de encrencas com a justiça, Barros não se arrisca a sugerir que as eleições foram roubadas:
“Não estou aqui questionando o resultado das eleições, mas questionar a conduta da Justiça eleitoral eu acho muito importante para o Brasil, porque esse ativismo político a gente não pode ver repetido nunca mais”.
Quer dizer: questionar “a conduta da Justiça eleitoral” por causa do seu suposto ativismo político é mais do que razoável, mesmo que se ponha em dúvida a limpeza do processo eleitoral. A canalhice de determinados homens públicos não tem limites.
Na semana passada, Costa Neto visitou ministros do Supremo Tribunal Federal para avisá-los que não levassem a sério o que Bolsonaro o obrigaria a fazer. Deve tê-los lembrado sobre sua posição em setembro de 2021 em defesa das urnas eletrônicas.
À época, enquanto os bolsonaristas pregavam o retorno do voto impresso, Costa Neto era contra, e argumentava:
“Não se trata de ser contra ou a favor do Bolsonaro. Se trata de defender os interesses do país”.
Os interesses dele, de ocasião
Ricardo Noblat
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