
A cena patética da audiência de custódia de Jair Bolsonaro, em que ele alegou uma “alucinação” para tentar violar a tornozeleira com uma solda, expôs algo maior sobre a família.
Os três filhos — Flávio, Carlos e Eduardo — formam o núcleo que mais empurrou o ex-presidente para o desfecho que agora o mantém atrás das grades (Jair Renan não conta por motivos óbvios).
Cada um, à sua maneira, ajudou a destruir a figura paterna, como num processo de parricídio simbólico. A psicanálise de Freud sobre Dostoiévski, que ligava culpa e autopunição a desejos reprimidos contra o pai, ajuda a enxergar como essa dinâmica opera quando poder, medo e ódio se misturam.
Bolsonaro inventou para a juíza que teve um surto, que imaginou haver escuta dentro da tornozeleira e que queimou o equipamento por paranoia. É um pilantra vulgar, afundado pelas próprias mãos e pelas ações dos filhos.
A vigília convocada por Flávio acelerou a prisão preventiva. As ações digitais de Carlos alimentaram o ambiente de hostilidade que cercou o processo. A radicalização de Eduardo nos EUA ajudou a mantê-lo preso à ala mais extremada, impedindo saídas institucionais. Em vez de proteção ou contenção, ofereceram-lhe estímulos para os crimes e as canalhices.
Freud dizia que, depois de desejar matar o pai, Dostoiévski se identificava com ele e punia a si mesmo pelos impulsos reprimidos. No bolsonarismo, os filhos se identificam com a persona política criada pelo pai, mas, ao mesmo tempo, alimentam a destruição dele ao estimularem os impulsos que o levaram à ruína.
Foram eles que reforçaram a retórica sem freios, que transformaram delírio em método, que apostaram na escalada contínua do golpe. O resultado está aí: Bolsonaro enfrenta uma prisão que pode lhe custar a vida.
Aos 70 anos, Bolsonaro vê a liberdade escorrer por erros que ele mesmo cometeu, mas que foram potencializados pelos filhos que dizem defendê-lo. Eles não precisaram levantar a mão contra o pai. Bastou empurrá-lo, dia após dia, para o abismo que agora o engole.
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